quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

De como me tornei tricolor paulista ou Um cara de sorte

Texto publicado originalmente no Bolonistas...

http://osbolonistas.zip.net/amaral/arch2005-11-01_2005-11-30.html

Explica um pouco o começo.

E dá uma vontade enorme de voltar ao Pacaembú, com meu pai e os pequenos.


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Uma Pequena República Não Democrática


Bolonistas da Confraria

Outro dia reli textos do nosso diário. Bom passatempo. Noutro dia, reli as razões do Renato para o Flamengo. Coisa de Andrade, Adílio e Zico. A paixão por um clube é algo que merece dissertações de mestrado. E inesgotáveis debates etílicos.

Nosso Massoneto, ainda noutro dia, aqui neste nosso valhacouto, postou figurinhas do Tricolor de 1978 ou 1979... Toinho, Getúlio, Edu. Sem querer, Massoneto, trata-se de um homem preciso, acertou na mosca. As razões tricolores estavam um pouco naquele esquadrão desajeitado, base do time campeão brasileiro de 77 e vice campeão paulista de 1978. Perdemos para o Santos, do terrível Juari, que adorava marcar goles no Valdir Peres.

Nem me lembro corretamente da seqüência dos fatos, mas já disse noutras vezes que isso pouco importa. Lembro-me do nosso Fiat 147, bege escuro – porque será que não descrevemos as cores com simplicidade, com um simples e explicativo marrom? – e a pergunta: "Pai, pra que time você torce?". Meu pai, um pouco desajeitado, respondeu: "Pro São Paulo". Pronto, sem querer também, sem fanatismos, meu pai acabara de criar no herdeiro outra paixão, esta voraz, entusiasmante, delirante.

Vivíamos uma espécie de ressaca cívica pós jejum. Em 77, 78, todos, absolutamente todos, eram corintianos. Dos colegas de escola, da rua. Da praia. O Timão era a coqueluche. Minha mãe... esta apaixonada pelo meu pai, deve ter dito que era são-paulina. Meu chapa parceiro, meu irmão Edu, nunca, nunquinha, gostou de futebol. Mas, o restante, eram todos adeptos do escrete de Basílio, de Russo e de Aladin. Meus tios, Celso e Sérgio, primeiros parceiros de bola, corintianos. Meus primos e grandes parceiros infantes, o Ivo, o Charles e o Djalma, nas minhas primeiras pelejas de Estrelão e nas primeiras peladas na casa da Vó Tereza, desfilavam sorridentemente o corintianismo. A saudosa casa da Vó ficava na Vila Matilde, Zona Leste da cidadela de São Paulo, o pedaço da paulicéia mais alvinegro de Parque São Jorge. Para os meus olhos, ainda uma cidadela, que começava na Avenida Nove de Julho e acabava na Toco, no Largo da Dona Matilde. Pasmem!

Mas "Seu" Nilton me levou ao estádio pela primeira vez, depois daquele nosso misterioso colóquio no nosso Fiat 147. Diria que foi um pragmático. O torcer do "Seu" Nilton não era, não é, nada fanático. Aqui entre nós, deve ter sido um cadinho doente também nos idos dos anos oitenta, não por causa do tricolor, mas para evitar as reações coléricas deste missivista eletrônico. Deve ter sido no simpático Pacaembu. Sinceramente não me lembro. Acho que nem ele. Mas começo de paixão é esquisita, sempre, e o frio na barriga se dá por razões desconcertantes e, não raro, desconexas.

Com a ajuda do "Google", lembro do esquadrão, disso eu me lembro: Valdir Peres, Getúlio, Bezerra, Estevam (o Estevam Soares, técnico de futebol) e Antenor; Chicão, Theodoro e Dario Pereira (sim, Dom Dario era camisa dez), Edu, Milton (o Milton Cruz, auxiliar técnico do SPFC) e ele, o infernal Zé Sérgio. Deste time, tinha o Serginho, ainda cumprindo suspensão pelo safanão em um bandeirinha. E tinha o Toinho, eterno segundo goleiro de Valdir Peres, mas ídolo dos tricolores. Mas me lembro daquele jogo por causa de Edu, o ponta direita, naquela época tínhamos pontas. Lembro que a torcida apupou o ponta direita, daquela forma ranheta que só as torcidas sabem praticar. E apupos mil. Edu, descobri depois, era um ponta que tinha vindo da Academia. Sei lá se este era o motivo da antipatia, ou se naquele jogo o tal do Edu não jogou nada mesmo. Mas o tricolor venceu. Meu pai deve ter ficado feliz e eu, bom, vocês podem perceber no que se transformou esta história. Obrigado, Luís, pelas lembranças.

Nosso diário, definitivamente, é o informativo e o memorial de uma república. Uma república não democrática, disse o Renato. Eu diria uma pequena confraria republicana de saudosos guris de pés descalços, que a democracia é o que é, e não o que acham que é. Grande abraço.

2005. novembro, 09.

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